Quando vires a Blue Morpho oferece-lhe os teus sonhos,
para ela os levar ao Grande Espírito
"A Borboleta Azul"
As borboletas são profundamente simbólicas da nossa capacidade para crescer
e nos transformarmos. Em grego o seu nome é “Psyque”, que também significa
“alma”, “sopro”, “respiração". Adornada com um azul vibrante e metálico na parte
exterior das suas asas, a Morpho azul
mostra-nos a máxima beleza da própria impermanência. Na sua metamorfose todas
as borboletas passam várias vezes pela morte de uma fase anterior: elas começam
como lagartas que um dia se isolam na escuridão e na quietude do casulo,
emergindo no momento certo -nem antes nem depois do tempo-, como as belas
criaturas aladas que na verdade são. No seu voo ajudam-nos a redescobrir a
graciosidade de nos elevarmos sem esforço: se algo nos estava a impedir de
avançar no nosso crescimento, agora é o momento de avançar sem medo de perder a
segurança e deixando algo morrer para podermos assumir o nosso ilimitado potencial
partilhando a nossa capacidade criativa com o mundo.
Elas ensinam que a vida é uma constante mutação e a mudança deve ser tão
natural como respirar. Podemos aprender a avançar da melhor forma possível no
nosso caminho se soubermos reconhecer em que fase do seu ciclo estamos: o ovo, a
lagarta, a crisálida ou a borboleta? Sem pressas nem estagnações, cada uma
destas 4 fases tem o seu paralelo nas fases de nascimento de uma ideia entre o
pensamento e a sua manifestação no mundo exterior. Ser perspicaz e discernir com clareza onde nos encontramos será fundamental para um Bom Caminho. A Borboleta representa não
apenas a mudança de forma mas também de perspectiva para evolução e crescimento
da alma, relembrando que isso não precisa de ser algo traumático.
As borboletas recordam-nos também as ligações entre tudo o que existe, pois
as linhas invisíveis que nos unem são mais fortes do que conseguimos
percepcionar sendo que um pequeno acontecimento como o bater de asas de uma
borboleta pode provocar um furacão no outro lado do mundo- fenómeno a que se
chamou mesmo “butterfly effect”.
Este género de borboletas recebe o nome de “Morpho” do grego μορφώ, que
significa “forma”/“formosa”, um epíteto para Afrodite ou Vénus. As lamelas iridescentes
de algumas delas estão apenas presentes no dorso das asas e aí a cor que
produzem varia com o ângulo em que são vistas, já na parte ventral varia nos
tons castanhos imitando “olhos” (ocelli),
que procuram afastar os predadores quando as asas estão fechadas. Existem cerca
de 80 espécies de Morpho distribuídas
pela América Central e do Sul. O tamanho das suas asas é desproporcional em
relação ao do corpo, podendo variar entre 7,5 e 20 cm e são territoriais
gostando de viver no interior da selva mas buscando por vezes os raios de sol
para se aquecer. Vivem solitariamente exceptuando a época de acasalamento,
gostam de se alimentar de sumo de fruta fermentada e os adultos vivem cerca de
um mês.
As minhas memórias mais impactantes com borboletas remontam a 2001/2002
quando, ao atravessar o rio Usumacinta (fronteira entre o México e o
Guatemala), o ar abafado à beira da água se mostrou repleto de borboletas
amarelas que cumpriam a sua vida deitando-se em fúnebres tapetes coloridos.
Nessa época cheguei também a “peregrinar” às frias montanhas de Michoacan com
dois amigos que queriam ver a migração anual das borboletas Monarca,
encontrando aí os pinheiros revestidos do seu laranja e preto como se adornados
com uma roupa solar.
Cerca de 8 anos mais tarde, uma semana depois de assumir o amor por aquele
que se tornaria o meu companheiro de vida, regressava por três meses à minha
terra mexicana com o propósito de encerrar um processo de transformação
profunda que se iniciara um ano antes com um acidente que me deixara 6 meses
sem caminhar. Foi em pleno processo de regenerar o meu pé direito até ao osso que
sintonizei os elixires de Rosa e de Glória da Manhã (Ipomea Carnea), no jardim do Martim, um amigo visionário que vivia isolado
perto da zona arqueológica de Palenque. Todas as noites dormia feliz na rede de
baloiço, acordando já de manhã com bandos de pássaros a banquetear-se com as
bananas maduras que pendiam da cozinha aberta. À parte disso, o silêncio cheio
da selva tomava conta de tudo. Um dia, enquanto pintava uma janela que o Martim
me pedira, senti uma presença silenciosa no prato de fruta que havíamos deixado
sobre a mesa.
Uma Borboleta Coruja, de asas consideráveis, ali estava
pousada alimentando-se com os seus grandes ocelli
fitando-me e ali ficou fazendo-me companhia todo o dia.
Nunca a vi a voar, mas
a certa altura colocou-se ao lado da pintura, imobilizando-se tempo suficiente
para me permitir desenhá-la nessa mesma janela.
Estes tinham sido os grandes encontros com
borboletas de que me lembrava, mas nada comparado com a magia que nos esperava
quando, um ano depois (2011), voltava ao México desta vez com o meu
companheiro. Desde 2000 que viajava para aquele lado do Atlântico e sempre o
fizera sozinha, mas o facto de, durante toda a viagem, as borboletas parecerem
seguir-nos e querer tocar-lhe tornava tudo ainda mais especial.
zona arqueológica de Tikal (actual Guatemala)
Apresentei-o à minha terra amada, um terreno de que cuidava (2 kms
selva dentro), e estávamos já de partida quando sentimos o som quase
imperceptível de umas asas azuis bordadas de negro. Uma grande Morpho Peleides atravessou o espaço
entre nós como se fosse um espírito, deixando-nos siderados com a aparição-
especialmente porque em tantos anos eu nunca tinha visto uma única Morpho! No dia seguinte tivemos de
voltar e, tal como no dia anterior, ela surge… mas agora acompanhada de outra Morpho Peleides mais pequena e, com a
beleza sublime das suas grandes asas azuis revoluteavam as duas pelo ar numa delicada dança
de acasalamento à nossa volta, que nos envolveu e deliciou.
Nabokov,
que além de escritor era um coleccionador de borboletas, descreveu estas
borboletas como "shimmering light-blue mirrors" e eu agora
entendia-o… para mim tinha-se manifestado pela primeira vez a doçura e
embriaguez da vida em completude e, acima de tudo, eu era capaz de o
reconhecer!
Utilizando estas memórias tão presentes, sintonizei este elixir em Fevereiro
último, dia de eclipse solar a 8 graus de Peixes que só em 18 anos se repetirá.
Este eclipse rege o retirar dos véus que nos impedem de abraçar o infinito,
movendo-nos da escravidão para a liberdade, deixando ir o que precisa partir.
Quando me dirigi para o lugar onde temos a nossa
Roda da Medicina, as flores surgiam entre o verde por todo o lado, anunciando a
Primavera. Na tradição Hopi, a “Mulher Borboleta” é um espírito (katsina), que rege esta estação e que
dança espalhando o renascimento pelos campos- e eu senti-a presente!
Coloquei então uma labradorite, cristal que me
recorda as cores da Blue Morpho,
perto do geode já com a água dentro e, ao meditar sentada dentro da Roda, vi
uma cúpula de borboletas a formar-se sobre ela e por fim a voarem para os meus
braços e cabeça. Quando comecei a tocar o tambor, uma grande Morpho azul pousou na baqueta e dirigi-a
para o geode onde ela entrou na água e desapareceu quase imediatamente. As
restantes borboletas senti que as incorporava no meu peito, lembrando-me o
emblema dos guerreiros toltecas.
Coluna em basalto esculpida de um
guerreiro Tolteca vestido para a batalha no templo da Estrela da Manhã (Vénus),
em Tula, com o típico peitoral em forma de borboleta (México Central, 900 a.c.).
Para os Astecas a deusa Itzpapálotl ou “borboleta de obsidiana", pois dizia-se
ter facas de obsidiana na ponta das asas (provável referência ao negro da Morpho Peleides), representava o arquétipo colectivo da
anciã sábia, a bruxa poderosa que recolhia a alma, o sopro vital que escapa da
boca de quem está a morrer.
A cúpula desapareceu nesse momento e escutei
dizerem-me então: “inspira e expira 5 vezes”. Ao cumprir o pedido, senti a
minha visão a transformar-se para tons de vermelho e azul como se fossem os
olhos de uma borboleta. Ao investigar mais tarde descobri que, relacionado com
a cor particular de cada espécie, a sensibilidade dos foto-receptores dos seus
olhos é particular exactamente no espectro dos ultravioletas, azuis, vermelhos
e amarelos.
Estranhamente
não ficou o entusiasmo habitual quando sintonizo cada elixir, talvez por
esperar que a experiência fosse ainda MAIS arrebatadora do que isto! Como se
tivesse que me recordar que grandes coisas acontecem nas subtilezas! No
entanto, logo no dia a seguir surpreendi-me a mim mesma com um intenso desabafo
com o meu companheiro, 4 dias depois teve lugar um corte fundamental de uma
amizade comum que se tornava um peso e da qual tínhamos de nos libertar, as
minhas palavras foram-se revelando mais autênticas e livres ainda e, a partir
daí, ambos temos sentindo as nossas asas a abrirem-se em toda a sua magnitude
no nosso caminho pessoal!
Palavras-Chave: Auto-transformação,
auto-conhecimento, clarividência, clareza mental, visão clara, novas etapas, liberdade, leveza, renascimento,
ciclos da vida, movimento
Planetas Associados: Mercúrio/Venús-
reunindo as capacidades de rápida mudança, de ser mensageiras e de estar
em constante movimento de forma graciosa
©Sofia Ferreira
Verdadeiramente hermosa experiência, multidimensional e misteriosa, mas também en concordância com a empírica ciencia da vida... gratidão
ReplyDeleteLindo texto, obrigada!
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